12.11.10

Era o hiato mais charmoso do vocabulário. Fazia pronúncia de vocábulo de classe e tudo mais, o hiato metido. O pomposo, contudo, ai contudo, ia se tornando um desfalecimento de órgãos, a perda da poesia, a merda da poesia. O hiato era pronunciado com dor, com doses de álcool, com olhos sem os olhos, com infinito longe de coração, com coração longe das retas.
O hiato era maldito e mal sabia. Sabia da vontade contida, retida, cortada, talhada de ser ditongo. Vontade maldita, mal dita, mal dita. Já não aguentava a possibilidade da separação das suas sílabas, a dor do seu sentido, a solidão das suas letras. Ditongos, pequenos encontros armados pelo destino que fazem as partes de mim se encontrarem e dali nunca separarem. Nem dia das crianças nem Círio nem natal nem ano novo, nem no anteceder do encontro final no infinito. Ah, céus, como o hiato queria ser ditongo. Ele fora maldosadamente, inescrupulosamente, pejorativamente escolhido para ser o hiato mais bonito. Ironicamente, a vida, ai a vida, escolhera o hiato para ser o mais doloroso dos impactos, o mais amiúde das vidas infelizes, dos olhos sem fim. O hiato pomposo era metido, era infeliz, era estranho por sentir que transmitia todas as doses que a vida tem de maldade.
O hiato queria ser ditongo porque não aguentava mais ser sa-u-da-de.

Nenhum comentário:

Postar um comentário